Opinião
Voltando no tempo
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Nasci no início dos anos setenta, um período marcado pela transformação na panificação. Nessa época, as redes de supermercados optaram por comercializar pães produzidos de forma rápida, utilizando equipamentos modernos. Como resultado, as padarias tradicionais, que antes estavam em cada esquina, começaram a entrar em declínio. No entanto, guardo memórias vívidas dessas padarias; recordo de pestanas crocantes e miolos branquíssimos e macios, além do calor dos fornos a da lenha que aqueciam as casas do padeiro. Essas lembranças são um testemunho do valor da panificação artesanal, que continua a inspirar quem ama a arte de fazer pão.
Meu nome é Augusto e minha trajetória como padeiro começou há décadas. Para entender como cheguei a essa paixão pela panificação, é preciso voltar no tempo. Embora não me recorde da primeira vez que provei um pão, eu me lembro nitidamente da primeira vez que tentei fazer um. Minha tia avó, uma boleira talentosa, fazia pães em casa, mas os resultados variavam bastante. Atraído pela experiência, eu, ainda com quatro ou cinco anos, moldava sobras de massa em formas de bichinhos, colocando-os em uma assadeira untada com manteiga e observando ansiosamente enquanto assavam. Mal sabia que, ao abrir o forno, encontraria pães achatados que nada lembravam as minhas criações.
Testemunhei a transição do pão artesanal para o pão industrializado, cuja textura não se comparava ao que era produzido nas padarias tradicionais. Contudo, uma viagem ao Uruguai mudou essa percepção. No café da manhã de um hotel, experimentei um pão de crosta grossa e miolo denso que me encantou, acendendo uma chama de interesse na panificação.
Esse fascínio cresceu ao longo dos anos; a primeira vez que fermentei uma massa, buscando fazer pizza, foi trágica, resultando em um disco de couro cru. Mas tudo mudou quando minha esposa, Daniela, trouxe um livro de páginas amareladas de Olivier Anquier, que despertou o meu interesse pelo pão de levain. Através da leitura, compreendi a importância da fermentação natural e decidi embarcar nesse desafio.
Naquele momento, minha jornada como padeiro começou a se expandir. Presenteando amigos com pães e outras delícias, meu entusiasmo pela panificação aumentou. Contudo, após um período de experiência, minha produção ficou esporádica, até que minha paternidade me trouxe um novo impulso. Quando decidi que queria viver fazendo pão, Daniela me apoiou e começamos a vender as nossas produções no Facebook e em lojas locais.
A garagem de casa se tornou o nosso pequeno templo da panificação. Com o tempo, equipamos nosso espaço e, após transições difíceis, como a falha dos fornos, nos adaptamos a essa nova realidade. Estudando obras de mestres como Raymond Calvel, nossa produção evoluiu e decidimos nos dedicar integralmente a esse sonho, desafiando as opiniões alheias. Hoje, nosso foco não é crescer em proporções industriais, mas manter a essência do que fazemos, valorizando a verdadeira arte da panificação.
Não me arrependo de nenhuma escolha nessa jornada. A vida é breve demais para não seguirmos as nossas paixões.
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